O que é que eu sei sobre isto?

Um dia alguém teve a ousadia de me perguntar qual é o maior sofrimento humano. Eu – logo eu! – respondi, sem hesitações e certíssima de mim, que é o Amor. E o que é que eu sei sobre isto? Do amor sei quase nada, mas gosto de falar sobre ele, principalmente nas alturas em que não é tão bom amar.

Por não saber quase nada do amor, pode ser perigoso e incompreensível dedicar-lhe espaço no meu bloco de notas. Há coisas que não se percebem e esta é uma delas. E quem perceber alguma coisa, nunca viveu um grande amor ou não o viveu como deve ser vivido. O amor não tem de ser entendido. Amor é Amor. Ele não merece que o tratem com eufemismos eruditos, sábias analogias ou recursos expressivos. Não gosto quando lhe fazem contas em poemas ou que o justifiquem com interpretações nos livros de Português. Estudar que é fogo que arde sem se ver é dar-lhe literatura e importância. O amor não se sabe o que é. E é essa a beleza e é esse o sofrimento.

Amar tem tanto de sofredor como de bonito. Não me venham cá dizer que é impossível morrer de amor e que foram doenças que mataram os poetas. É que este sofrimento é insuportável! Um desgosto é uma dor física! O que é uma ferida aberta comparada com as saudades, o desespero, a aflição, a angústia e um coração partido? Não há médicos, pensos rápidos ou pomadas com componentes milagrosos capazes de curar um coração. E saber disso é o sofrimento.

Há quem escolha não sofrer, mas quem não quiser sofrer nunca vai amar nem vai ser amado. Sofrer ao amar é viver exaltado, preocupado e expectante de se ser amado por quem se ama. Sofrer ao ser amado é viver assaltado com o pensamento da possibilidade de deixar de ser amado por quem se ama. Permitir o amor é antever a dor. O amor é inquietante. E é uma chatice.

Eu já vivi um grande amor: o Primeiro. Dizem que não há amor como o primeiro e eu concordo. Acredito que depois dele venham amores melhores, maiores, mais bem pensados e melhor vividos, mais felizes e que nos façam melhor. Mas é o primeiro amor que nos ensina o amor e que nos estraga o coração. O primeiro amor não se vive na infância ou na adolescência. Eu vivi o meu primeiro amor depois de ter vivido outros. O primeiro amor quer tudo para ele. Leva tudo de nós e não deixa cá nada. Prepara-nos para sermos felizes, mas destrói e tira-nos os sentidos. É uma casa que nos fez crescer, mas onde não podemos regressar. É o lugar feliz onde não devemos voltar. Afinal o amor é um trapezista sem rede, é uma criança na piscina dos grandes, é um apresentador sem teleponto.

O primeiro amor mata, mas o segundo dá vida. Os próximos amores são os que valem a pena. São mais bonitos e perpétuos. Devolvem-nos todos os sentidos. São a cola, os agrafos, a linha e o gesso para remendar um coração. São a solução, a fragilidade, a intimidade e a inocência que o primeiro roubou. Nestes, até o Cupido joga a nosso favor e traz o que é preciso para o reparar. Mas não confiem tudo nele… tem mais que fazer e não trabalha fora do horário de expediente. Experimentem praticar o que aprenderam com o primeiro amor e vejam a felicidade. Aqui encontram um par para dançar a vossa melodia. E dança-se muito melhor! O primeiro amor nunca é o último, o resto é que é. E saber disso é a beleza.

Um dia alguém teve a ousadia de me perguntar qual é o maior sofrimento humano. Disse-me que é a morte. Eu ri-me: “Só se estiveres a morrer por amor.” Vivam, amem-se e morram por amores. O que todos queremos, no fundo, é alguém que morra por amor por nós.

Fica o meu reparo: se não perceberem nada do Amor é porque estão no caminho certo.