Em que Portugal vivemos? Certamente não no Portugal dos descobrimentos com a sua riqueza e prestígio, afinal de ricos não temos nada e prestigio se o há, poucos o vêm. Será então o Portugal idílico de Camões, onde até os Deuses reconhecem o valor do povo lusitano? Ou “O Sentimento dum Ocidental” de Cesário Verde, onde a cada passo dado é despertado “um desejo absurdo de sofrer”?

Portugal, um país de grande história, literatura e cultura que com valentes esforços foi erguido, seu pai, D.Afonso Henriques o “Conquistador” e “Rei Fundador”. Desde sempre um país de nobres e valentes guerreiros, ambiciosos pela conquista, sedentos pelo saber, ousados e ferozes pelas descobertas, o “peito ilustre Lusitano”. Portugal, com suas praias cristalinas onde passeiam as varinas, os férteis terrenos que os agricultores com mestria cultivam, a romântica brisa nos prados e o aroma das flores de Garrett, os nobres castelos exibindo força e poder, os belos e adornados palácios, delicados jardins, a trágica fonte nascida das lagrimas do amor eterno de Pedro e Inês, as noivas de Viana com seus reluzentes cordões de ouro e honesto trajar, os cravos vermelhos da liberdade adornados pelo cantar revolucionário de Zeca Afonso, a apaixonada, melancólica e cheia de emoção “Canção do Mar” de Dulce Pontes. No desporto também nos destacamos, com os saltos de Pichardo e Mamona que quase tocam o céu, Rosa Mota que corre com o vento, Ronaldo e a seleção que jogam com orgulho pela nação e os corajosos Lobos do rugby que continuam a batalhar e aos portugueses orgulhar.

Mas então em que Portugal vivemos? Depois das conquistas e das descobertas o que resta do povo lusitano? Nas ruas onde antes apregoavam os ardinas, dormem agora sobre os velhos jornais os pobres sem-abrigo sem teto nem futuro, o apito alegre do amolador já quase nem se ouve sobre o som das máquinas cujo ganha-pão agora lhes rouba. A trabalhada e orgulhosa calçada portuguesa começa-se a esconder sob o lixo nas ruas, os trabalhadores chegam cansados porque o labor aumenta e o dinheiro diminui, são muitas as contas para pagar e os cobradores não vão esperar. Vivemos num país onde o povo é despejado, vivem em tendas agora porque o dinheiro vem primeiro. Um povo revoltado cuja alma lusitana foi quebrada espezinhada, um povo que grita pelos seus direitos, sobreviver não é viver. Os hospitais a fechar, doentes por tratar, famílias a chorar. Ricos cada vez mais ricos e pobres cada vez mais pobres, o contraste não poderia ser maior.

A meu ver o país em que vivemos é o bom e o mau, o passado e o presente, monarquia e democracia, de tudo isto e muito mais é feito Portugal com seus 880 anos de história, o pesar do tempo em suas costas com tantas conquistas e derrotas. Muitas opiniões se podem dar e muito reclamar, mas no fim o ar que respiramos a cultura que preservamos e celebramos, os poemas que declamamos, as músicas a que dançamos, rimos e choramos, é tudo português, um povo que sofre que luta mas que no fim se junta.

Este é o Portugal em que vivo, o Portugal em que vivemos.