Na passada quarta-feira, dia 15 de outubro, os anjos mais famosos do mundo da moda voltaram a desfilar na cidade de Nova Iorque.

O desfile anual, tem como objetivo promover a marca de lingerie da Victoria´s Secret e, acima de tudo, a sensualidade feminina num espetáculo de luz e música, detalhadamente, planeado, onde as supermodelos mais famosas do planeta desfilam com asas deslumbrantes, corpos esculpidos e sorrisos impecáveis. Ao longo dos anos, começou a ser chamado de “SuperBowl” feminino, onde os padrões de beleza eram restritos e apenas um certo tipo de corpo parecia ser aceite como símbolo de perfeição quase inatingível.

Mas o mundo mudou. E com ele, também a forma como olhamos para a beleza, a sensualidade e o corpo feminino. O que antes era sinónimo de glamour, começou a ser símbolo de exclusão. As asas que outrora faziam sonhar tornaram-se, para milhões de mulheres, um lembrete do que nunca poderiam ser.

Em 2019, o mundo da lingerie e das asas de anjo foi assombrado por uma onda de críticas e controvérsias, com o surgimento de denúncias de más condutas para com as modelos, discursos transfóbicos e uma clara falta de inclusão que deixaram a marca em queda livre.

Já em 2025, e após um grande falhanço no retorno do desfile no ano passado, as expectativas e opiniões dividiram-se nas redes sociais. A edição prometia o regresso de veteranas consagradas como Adriana Lima, Barbara Palvin e Candice Swanepoel e com ela trazia, também, a aposta em novas caras, como as influencers Gabi Moura e Quenlin Blackwell, culminando em acesas discussões sobre a perda da essência do que é, afinal, ser uma modelo “com asas”.

No meu ponto de vista, a inclusão destas novas e refrescantes caras no mundo da moda é essencial para garantir a renovação do padrão da moda. É marcante poder transmitir a mensagem de que a indústria da moda não é um nicho fechado onde apenas entra quem começa desde muito jovem ou tem contactos. Ao incluir neste evento, influencers que vimos crescer nas redes sociais e que partilham o seu dia a dia e personalidade, podemos perceber que ser um “anjo” não é algo impossível.

No que toca aos looks, o brilho, a renda e a transparência voltaram a dominar, agora com um toque moderno de sobreposição de peças, calças de cetim e acessórios maximalistas. No entanto, as críticas não ficaram atrás: muitas modelos comentaram o desconforto causado pelo peso das novas asas, símbolo histórico da marca, que parece continuar a carregar não só plumas e cristais, mas também o peso de um passado difícil de deixar para trás. O desconforto da modelo Bella Hadid durante um dos seus desfiles na passarela foi alvo de críticas pelos fãs, que realçaram a falta de consideração da marca para com a modelo, que estava a passar por um momento frágil no que toca à sua saúde.

Entre os momentos mais marcantes da noite esteve a atuação poderosa de Karol G, que levou um toque de latinidade e empoderamento à passarela.

A sua performance foi mais do que uma simples atuação musical, mas sim uma declaração de identidade. O cenário ganhou vida com cores quentes e ritmos envolventes com o momento simbólico, as palavras “Latina Foreva” iluminadas no chão do runway. Karol G deu assim, uma masterclass de catwalk com traços de confiança, sensualidade, mas acima de tudo orgulho de onde nasceu e de quem é. O que é, na minha opinião, aquilo que de mais bonito a moda tem para nos mostrar.

E, como já é tradição, o público não guardou para si, os comentários menos favoráveis, transportando-os para as redes sociais. Houve quem criticasse a presença de modelos consideradas “padrão”, por representarem uma beleza inatingível, e quem se mostrasse insatisfeito com a inclusão de modelos plus size, acusando a marca de querer agradar a todos sem consistência e de perder a essência do desfile dos “anjos”.

No meio deste fogo cruzado, a Victoria’s Secret parece continuar a procurar o seu lugar, entre o espetáculo e a autenticidade, entre o passado e o presente.

Por isso, pessoalmente, considero que o verdadeiro desafio da marca está em compreender que não há um único molde de beleza feminina. As asas podem continuar a brilhar, mas só farão sentido se forem leves o suficiente para carregar a diversidade, a representatividade e, sobretudo, a verdade. A Victoria’s Secret pode até tentar renascer, mas só será relevante novamente quando perceber que o poder das mulheres não vem do tamanho das asas, mas sim da liberdade de serem quem realmente são – um lembrete que também deveria ser dado a todo o público que assiste ao desfile e procura continuar a venerar padrões ultrapassados e fechados.