Carta Aberta ao Natal
Há algo em ti que nunca sei explicar. Chegas sempre como quem traz uma promessa, mas também carregas algo que não se diz. És feito de luz e de sombra, de presença e ausência, de gargalhadas e silêncios. Quem és tu, afinal?
O cheiro da canela mistura-se com as lembranças. A mesa está posta com a esperança dos reencontros, mas há lugares que, mesmo vazios, gritam com uma força silenciosa. Como é que o amor consegue ser tão grande que às vezes até dói?
És como um livro que releio todos os anos, mas algumas páginas estão marcadas. Não te culpo, nem poderia. És o espelho das nossas vidas, nunca inteiro, nunca perfeito.
Lembro-me dos natais da infância, quando eras só luz, só cor e só riso. Hoje, és mais humano. Tornaste-te num espelho do tempo que passou, das perdas que ficaram e dos amores que resistem. És como aquele chocolate amargo que nos vicia porque sabemos que nele há verdade.
Pergunto-me, Natal, se vens para nos testar. Para ver se ainda conseguimos sorrir mesmo com o peso das ausências. Ou será que és uma forma de nos ensinar que a saudade é, na verdade, outra forma de amar?
Nas tuas noites, as estrelas brilham com mais força. Ou talvez sejam apenas os nossos olhos, molhados de lembranças, a vê-las de maneira diferente.
E, no meio de tudo, há algo em ti que nos salva. És um silêncio carregado de significados, o abraço que nos falta e o calor que encontramos nos outros. És a prova de que o amor é maior do que a ausência e que a saudade pode ser um lugar onde ainda moramos juntos.
Então, Natal, ainda que venhas com lágrimas escondidas entre os brilhos das luzes, fico feliz que voltes.