Cristina Branco concedeu-nos uma entrevista durante o sound-check. A artista chegou até nós bem-disposta e com um à vontade constante, mostrando a sensibilidade e sentido de humor que a caracterizam. Confessou-nos que é licenciada em Comunicação Social de forma a deixar-nos mais confortáveis na conversa que se seguiu, onde nos explicou o porquê de uma música tão única e diferente.

UTAD TV (UT): O que difere este novo álbum Menina dos anteriores e porquê este título?

Cristina Branco (CB): São duas perguntas numa. Então, este álbum é um álbum um bocadinho diferente dos anteriores, se quiseres é um álbum de transição do passado para qualquer coisa que ainda não sei exatamente o que virá a ser. Será sempre fado, no meu ponto de vista vai ter sempre fado, agora, pode distanciar-se, até porque isso é um hábito meu. Todos os meus álbuns normalmente são de rutura com qualquer coisa do passado, portanto, este no fundo é um bocadinho a mesma coisa só que na verdade tem mais frescura porque os autores que fazem parte deste disco, a grande maioria deles vêm da música independente, a música indie portuguesa, são todos muito jovens e dão uma tonalidade um pouco diferente ao disco. Depois, ele chama-se Menina porque eu tive um sonho [risos] que criativo, quando estávamos a produzir o disco, quando estavam a chegar as músicas e naquela confusão toda, aquele entusiasmo, sonhei com um trabalho que tive de fazer na faculdade à volta de um quadro do Diego Velázquez, um quadro que está no museu do Prado e que se chama Las Niñas e esse quadro é justamente sobre a dimensão do olhar, há várias coisas históricas que se passam naquele quadro e de repente eu estava a falar lá em casa, com o meu marido, e estava a comentar ao pequeno almoço, porque eu normalmente não me lembro dos meus sonhos, e eu pensei assim: “se eu pedi aos autores para falarem de mulheres e para falar de mim, por que não chamar Menina ao disco?”. E foi assim que apareceu o Menina.

UT: Que música deste álbum destacaria? Qual delas tem um maior significado para si?

CB: Oh isso não é justo! Essa pergunta não é nada justa! [risos]. Elas têm todas muito significado porque são muito novas, porque falam de coisas que eu nunca falei com esta profundidade. É curioso porque são textos profundos com músicas todas muito mais leves, muito mais desempoeiradas. Qual é que tem mais significado? Têm todas. Elas contam histórias de várias mulheres diferentes, por exemplo, o Boatos fala da alcoviteira e daquela rapariga de conduta duvidosa, que há em todo lado, depois tens o drama do E às vezes dou por mim, que é uma canção de alguém que olha para o presente, é quase um olhar ao espelho e percebe que está, a dada altura da vida infeliz, está sozinha.

Cristina Branco – palco do grande auditório do Teatro de Vila Real

UT: E às vezes dou por mim é o single de apresentação…

CB: Sim, é o single de apresentação. É uma música e um texto de Linda Martini e Rui Carvalho, que é Filho da Mãe, e que fala de uma realidade muito dura, mas dentro de um ambiente musical completamente inovador. É como eu te dizia. Não é nada justo porque eu gosto delas todas no mesmo patamar.

UT: Como disse agora, alguns dos seus compositores pertencem a outros géneros musicais, tal com os Buraka Som Sistema por exemplo. Como é que se lembrou de contactar alguém que está mais virado para outros géneros? Como é que se conjuga todos esses estilos num só?

CB: É procurar sempre a novidade, procurar sempre qualquer coisa que esteja um passo à frente do que nós estamos a fazer hoje. Na verdade, todos estes autores, e já mencionei Linda Martini, Cachupa Psicadélica, Cão da Morte, Filho da Mãe, Buraka Som Sistema com o texto do Kalaf. Depois outros autores como Pedro Silva Martins, Ana Bacalhau, estou a esquecer-me de alguém certamente, mas eles vão perdoar-me. É assim, há uma importância muito grande nestes nomes e eles estão todos presentes nas nossas vidas. Tu chegas à Internet e é muito fácil ouvir o que é que eles estão a fazer, e foi um bocadinho por aí. Eu fui conhecendo alguns aqui e ali, não necessariamente em concertos, mas há alguém que eu conheço que os conhece e estás numa festa e falas, e claro que músicos falam de música e essas coisas acontecem. É muito normal e depois vais ouvir o que é que eles estão a fazer, se gostei da conversa dele deixa-me lá ir ver o que é que esta pessoa está a fazer. Estava a esquecer-me do Jorge Cruz também, dos Diabos na Cruz e foi assim que eu cheguei até eles e pensei “Eh pá, por que não?” por que não tentar fazer qualquer coisa com estes autores, eles têm no fundo uma característica que não está tão longe, quanto as pessoas possam pensar, do fado. Há uma certa nostalgia, um certo dramatismo, uma certa angústia nos textos da música indie portuguesa, e isso também está presente no fado. Portanto, não era assim tão ousado de repente pegar nos textos destas pessoas e foi um bocadinho por aí

Cristina Branco - sessão de autógrafos

Cristina Branco – sessão de autógrafos

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UT: Então definiria o seu estilo como sendo mesmo fado, apesar de ser algo mais contemporâneo?

CB: Sabes, isso é uma pergunta difícil de responder, porque a verdade é que o fado é uma coisa e as pessoas têm estado, de alguma maneira, equivocadas, porque o fado é uma música tradicional e o que nós estamos a fazer, e há muita coisa que se cria à volta do fado, que é subentendida como fado, não o sendo. Não quer dizer que daqui a vinte anos tu não pegues nestas músicas todas que estão neste disco e não digas “isto é um fado clássico”, mas hoje não é. Hoje é música portuguesa no seu melhor, mas não é fado, é outra coisa.

 UT: E o que é que espera para logo à noite? Já atuou aqui em Vila Real antes?

CB: Já! É a terceira vez. Nesta sala, curiosamente, ela foi remodelada, portanto com esta aparência ainda não tinha estado. E o que eu espero é que as pessoas se divirtam porque nós vimos cá para nos divertir muito.