Cláudia Martins está bem-disposta e concede esta entrevista, enquanto toma um café e fuma um cigarro, antes de ir para mais um ensaio na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). Nota-se que o Teatro é a sua paixão e demonstra-o durante toda a entrevista.

Cláudia Chaves (CC): Por que decidiste estudar Teatro?

Cláudia Martins (CM): Isso é uma pergunta complicada… Eu decidi vir para Teatro porque eu, quando era pequenina, era muito tímida e os meus pais inscreveram-me num grupo de teatro. O facto de ter entrado para teatro fez com que eu me libertasse mais e me tornasse uma pessoa com menos timidez e menos problemas em falar com os outros. Então, como me sinto muito bem em palco decidi vir para teatro.

CC : Como definirias o estado atual do Teatro no nosso país?

CM: O nosso país acho que está muito atrasado, temos muitos bons artistas, mas por falta de apoios, apoio financeiro e não só… porque as pessoas já não vão ao teatro como iam antigamente e então acabamos por ter uma falha enorme de apoios.

CC: Quando eras mais nova costumavas ir ao teatro?

CM: Por acaso ia…. Ia muitas vezes, com os meus papás.

CC: Onde te imaginas a trabalhar no futuro? Cá em Portugal, ou lá fora no estrangeiro, dado que a situação aqui está um pouco difícil?

CM: É assim, claro que eu gostava de trabalhar cá mas não faz parte dos meus objetivos ficar cá.

CC: Que área do mundo do espetáculo mais te cativa? Para além da representação, no Teatro, têm outras áreas que podem explorar, certo?

Cláudia Martins - ensaios

Cláudia Martins – ensaios

CM: Certo. De tudo o que nós aprendemos no curso, de todas as áreas que nós exploramos, porque o nosso curso é bastante completo, não é só Teatro, eu prefiro mesmo a parte da representação e encenação. Mas claro que também gosto da vertente de dança e cenografia, mas imagino-me mais a trabalhar em representação e encenação.

CC: Antes de vires para a Universidade tiveste alguma experiência artística? Como por exemplo peças na escola, grupos de teatro…

CM: Sim, sim…Tal como tinha dito fiz parte de um grupo de teatro desde os meus doze anos até vir para a Universidade. Só quando vim para a Universidade é que deixei de fazer parte do grupo de teatro. Também estava envolvida num grupo de dança na minha cidade e pronto, é isso.

CC: Quais é que são as tuas referências no meio artístico?

CM: Olha, eu tenho várias, mas posso dar uma principal. Por acaso no ano passado tive o prazer enorme de a conhecer, foi a Eunice Muñoz. Nós, no ano passado, fizemos uma peça performativa de homenagem à Eunice Muñoz e ela veio assistir, e tive um prazer enorme, mesmo, de a conhecer. É fantástica.

CC: Achas que a UTAD possui os materiais e equipamentos suficientes para ter uma boa aprendizagem?

CM: A UTAD tem os materiais para isso, não tem é professores nem a organização para tal. Falta organização para que o curso consiga ser aquilo que devia ser.

CC: Mas crês que a Universidade tem alguma outra coisa que outra não tenha? Ou seja, o que te levou, então, a escolher a UTAD?

CM: É assim, eu escolhi a UTAD porque era perto de casa e porque era a única Universidade do país que tinha o curso completo, que não era só direcionado para Teatro, mas, no entanto, no primeiro ano pensei em desistir e trocar para outra Universidade, só não troquei porque quis dar uma oportunidade ao curso cá, mas sinceramente estou muito arrependida de não ter mudado.

CC: Estás a pensar em continuar os estudos, fazer algum mestrado?

JM: Sim, tirar um mestrado. Tenho em opção o mestrado em encenação ou interpretação.

CC: Como vês a nova geração de atores sem formação?

CM: Sabes que maior parte dos grandes atores não têm licenciatura e as formações que têm é tipo workshops que vão fazendo e assim… Por isso, claro que me mete muita confusão ver os manequins que não sabem representar roubarem-me o trabalho, mas tirando isso, nada contra, cada um merece uma oportunidade.

CC: Quais são as características que consideras mais importantes, essenciais, para ser um bom ator/atriz?

Cláudia Martins - entrevista

Cláudia Martins – entrevista

CM: Houve uma altura em que um professor me disse isto, no meu primeiro ano, “Tu, para seres ator, tens de ter noventa por cento de trabalho e dez por cento de talento”. E é mesmo isso. Tu para conseguires ser um bom ator tens que trabalhar muito, e não é só trabalhar nos ensaios, é trabalhar em casa, que é uma coisa que as pessoas pensam, que o pessoal de Teatro é só ensaios e dancinhas e não sei quê e não têm noção do trabalho que nós temos por fora que é muito, é muito mesmo.

CC: Que espécie de trabalhos são esses que tu fazes “por fora” para melhorar?

CM: Olha, eu faço muito trabalho de investigação de personagem, no sentido de, por exemplo:  estou num café, estou sempre a observar toda a gente que está no café, ou toda a gente que eu conheço observo a um ponto absurdo porque qualquer tique, qualquer jeito é bom para uma personagem, e quando tenho que desempenhar uma personagem em específico tenho muito trabalho em casa. Trabalho de tiques, expressões, forma de falar… Não só o trabalho de decorar texto, mas essas coisas…

CC: Como se gere a carga psicológica que a representação requer? É fácil separar a vida pessoal das personagens?

CM: Não é fácil, quando estás muito tempo a desempenhar um papel e tens de trabalhar mesmo nele, não é fácil, não é fácil mesmo. Vou-te dar um exemplo: no ano passado, eu fiz uma… não foi no ano passado, foi há dois anos, foi no primeiro ano, eu fiz uma personagem no TuTRA (Teatro Universitário de Trás-os-Montes de Alto Douro) em que a personagem era… aquilo era uma peça sobre pessoas que já tinham morrido, estavam no Inferno… o meu personagem era um personagem com uma personalidade superforte, era a dita “cabra”, estás a ver? E eu tive que investigar, aprofundar a fundo essa personagem porque havia muitos pontos nessa personagem que eram fora de mim e foi muito complicado durante os tempos de ensaio abstrair-me um pouco dessa personagem, porque fora dos ensaios eu era essa pessoa.

CC: Sabemos que fazes parte do TuTRA… fala-nos um pouco desse projeto.

TuTRA - ensaios

TuTRA – ensaios

CM: O TuTRA foi sem dúvida uma das melhores coisas que a UTAD me trouxe. Porque o TuTRA é um grupo de Teatro Universitário, tu não estás só com pessoas que estão em teatro porque querem fazer disso vida, estás com pessoas que gostam de teatro e querem fazer teatro. Pessoas de Bioquímica, pessoas das Ciências que gostam e querem fazer teatro. E todas as experiências que eu tive com o TuTRA foram fantásticas porque, ainda o ano passado fomos a um festival a Lisboa, foram três dias fantásticos, foi muito bom, foi muito, muito bom, foi a melhor coisa que a UTAD me trouxe.

CC: Define numa palavra o que é para ti o Teatro.

CM: O que é para mim o Teatro? Casa.