Elisabete Ferreira é professora do ensino básico há 12 anos e a sua paixão pela educação aumenta a cada dia que passa.

Nesta entrevista, Elisabete esclarece alguns dos métodos que utiliza no seu quotidiano para cativar as crianças. Na sua opinião “o mais importante é valorizar a educação”. Esta assume ainda que o comportamento das crianças tem vindo a mudar, tanto na forma como estas encaram a escola e os colegas como nos valores que lhes são incutidos pelas famílias.

Juliana Machado: A sua vocação para a educação surgiu quando ainda era criança ou quando mais tarde se apercebeu que esta é uma das tarefas mais difíceis que temos em mãos?

Elisabete Ferreira: Desde criança não. Quando somos crianças sonhamos ser tudo e mais alguma coisa. Só mais tarde me apercebi. Não por ver que tem importância mas por gostar de lidar com crianças. Achei que seria uma boa aposta para a minha vida profissional.

JM: Pode contar um pouco mais sobre a sua carreira profissional?

EF: Comecei por estudar no Externato Delfim Ferreira, depois entrei na universidade em Viana do Castelo e aí vivi durante quatro anos. Terminei o meu curso em 2004 e felizmente consegui o meu primeiro emprego em Janeiro de 2005 onde trabalhei em apoios socioeducativos, em Rio Tinto. Eram famílias muito complicadas e crianças muito carenciadas. Tive a oportunidade de terminar esse contrato em Agosto e ser novamente colocada no Externato Delfim Ferreira, onde já trabalho há 11 anos.

JM: Com os seus 12 anos de carreira já observou certamente professores cujos métodos, não só de ensino mas também de transmissão de valores, não eram os recomendáveis. Na sua opinião o que distingue um bom professor?

EF: Tanta coisa! O mais importante, pelo menos para mim, é conseguir manter uma ligação próxima com os alunos e que eles saibam distinguir o professor amigo daquele que está lá para ensinar. Depois é importante conseguir transmitir aquilo que lhes quer ensinar. Conseguir descer à idade deles e ainda ajudar aqueles que tem dificuldades, isto é, aqueles que tem algum tipo de deficiência. Para mim esse é o trabalho mais complicado. Mas, sem dúvida, o mais importante é valorizar a educação. Aliar ao ensino os valores que as crianças, possam ou não, trazer de casa.

JM: Considera que existe espírito de entreajuda e trabalho de equipa entre os professores desta escola?

EF: Mais ou menos. Às vezes, não tanto quanto se gostaria! Se calhar por alguma falta de tempo para se poder partilhar. A nossa profissão é muito exigente no que diz respeito ao trabalho fora do tempo letivo com os alunos. Além disso, cada professor tem a sua vida pessoal. Alguns moram afastados da escola e esta consequente falta de tempo faz com que não se consiga partilhar tanto quanto se desejaria. Mas aquilo que é fundamental é partilhado.

JM: Sabe-se ainda que o comportamento das crianças, sobretudo a forma como estas encara as salas de aula, tem vindo a mudar ao longo dos anos. De que forma tem sentido esta alteração?

EF: Existem mais falta de regras e isso nota-se bastante. Hoje, as crianças tem muita dificuldade em receber um “não”. São muito mais agitadas e com gostos totalmente diferentes do que os que nos tínhamos há 10 ou 20 anos atrás. O comportamento é mais extrovertido, agressivo e estão mais à vontade em fazer asneiras. No nosso tempo nem pensávamos em fazer coisas que eles hoje fazem. Acho que não tem vergonha em fazer comportamento errados. A agressividade está mais presente nas atividades que eles tem nos recreios. A nível de salas de aula também se nota na relação que tem com os professores. Não conseguem perceber e sobretudo manter a distância necessária entre aluno e professor. Pensam que um professor é outro simples amigo ao qual estão à vontade para dizer e fazer tudo o que lhes apetece. Sentem-se muito à vontade hoje em dia para praticar esse tipo de comportamentos errados.

JM: Acha que as novas tecnologias tem alguma responsabilidade nessa alteração de comportamento?

EF: Sem dúvida! As crianças, nos dias de hoje, estão agarrados a qualquer tipo de tecnologia. Muito antes de aprenderem a falar já sabem desbloquear um telemóvel. O contacto com as tecnologias, principalmente os jogos e filmes violentos, fazem com que essa agressividade passe para as suas personalidades. Hoje tudo é muito rápido. Os filmes, os jogos são rápidos e as crianças não tem tempo de processar todas essas informações. Nota-se em contexto de sala de aula que estão sempre ansiosos por fazer coisas diferentes, tem poderes de concentração muito mais baixos porque esses jogos e vídeos não estimulam a concentração.

JM: De que forma tenta combater estes comportamentos?

EF: Tento manter contacto com os pais para perceber até que ponto estas tecnologias estão presentes na vida deles. Na escola o uso é proibido, mesmo nos intervalos. Todo o contacto com essas tecnologias é feito em casa.

JM: Concorda que o ambiente familiar tem uma relação direta com o “uso e abuso” das tecnologias?

EF: Não tenho grandes dúvidas acerca disso. Penso que o filho é o espelho da família. Se algo esta mal com as crianças a família é a causadora disso.

JM: De que forma poderão estas influenciar a interação entre as crianças?

EF: Por um lado, a violência mantém-se. Pode ainda ser uma influência negativa ao nível do recreio. Não libertam energias a correr, não estimulam o raciocínio. Vivem uma vida mais isolada. Uma criança que esteja a jogar um videojogo esta sozinha. Embora tenha um ou outro espectador não existe interação social.

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Juliana Machado

JM: O Externato Delfim Ferreira é valorizado na região, não só pelo sucesso escolar mas também pela relação próxima entre alunos e professores. A que se devem estas diferenças?

EF: Em primeiro lugar são pessoas que trabalham há muitos anos. Começaram numa era diferente da época de agora. São pessoas que gostam e se envolvem muito naquilo que fazem. Facilmente se colocam no lugar do aluno e tentam fazer o seu melhor.

JM: Quais as suas perspetivas profissionais para o futuro?

EF: Tantas! A questão é ter tempo para as realizar. Gostava de poder estudar mais. Fazer uma pós-graduação ou um mestrado. Sinto necessidade de evoluir. Ouve-se tantas vezes nos meios de comunicação social que a nossa escola ainda é do “século passado” que fico com vontade de aprender um
pouco mais. Conhecer alguns dos meios e técnicas utilizadas nos outros países e de que forma as poderíamos adaptar ao nosso. Aprender um pouco mais para ser melhor.