Quando o exercício físico é resposta para minorar os sintomas adversos da quimioterapia: “Desde que estou aqui, de tratamento para tratamento, sinto melhoras físicas”.

Ainda muito antes da pandemia José Vilaça-Alves, docente e investigador na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), deu início a uma investigação sobre a prática de exercício físico em doentes com cancro da mama.

“Na verdade”, explica o docente, foi um “resgatar” de um estudo iniciado em 2018 e terminado em 2020 pelo Tiago Rafael Moreira, estudante de Doutoramento em Ciências do Desporto na UTAD intitulado “Quality Onco Life”.

O projeto do Rafael Moreira desenvolveu-se em contexto presencial, mas José Vilaça-Alves considerou que devido à grande dispersão demográfica das pacientes do distrito de Vila Real e, igualmente, à necessidade de um ambiente controlado, pois estas pacientes estão imunossuprimidas, o recurso às novas tecnologias da comunicação “uma mais valia” para o programa, e assim, tendo em conta o uso de ferramentas online de videochamada, “conseguimos atrair mais participantes, encurtamos distâncias e facilitamos a vida das participantes que, mesmo estando longe da sala de aula aqui na UTAD, podem usufruir das sessões nas suas casas”, diz.

E ainda o assunto Pandemia Covid 19 não estava na ordem do dia…

Fomos espreitar uma aula e descobrimos que entre flexões e agachamentos, há muito mais a ganhar do que massa muscular. Se pensarmos na velha máxima do “corpo são em mente sã” encontramos nesta hora de aula um excelente paliativo para ajudar a “arejar” a cabeça. Fica bem registado que nem tudo o cancro levou.

Durante a sessão há tempo para colocar a conversa em dia, falar de trivialidades. Há risos, gargalhadas, suor e, por vezes, até lágrimas pela partilha de experiências e pequenas grandes vitórias e conquistas.

O convívio que se gera entre estas mulheres espelha esperança, vontade, superação. A razão de existir deste programa. Aqui a palavra “cancro” não evita de se dizer, mas tenta-se que fique à entrada da sala do Complexo Desportivo da UTAD, lugar que acolhe as sessões deste novo programa. Aqui falamos de vida. “O grupo é composto por mulheres que se encontram em fase de quimioterapia, adjuvante ou neoadjuvante, como tratamento do cancro da mama e com autorização médica para praticarem exercício”, apresenta José Vilaça-Alves, investigador e docente da UTAD, responsável pelo estudo.

O programa visa a melhoria da qualidade de vida, da capacidade funcional e da proteção cardíaca em doentes oncológicos com cancro da mama. Através da prática de exercício físico, estes reportaram uma melhoria nos aspetos relacionados com os efeitos secundários causados pela quimioterapia em mulheres com cancro da mama em fase de tratamento, como: capacidade física funcional geral e específica (mobilidade do ombro e força nos membros inferiores); sintomas como náuseas, vómitos, obstipação, insónias, depressão e ansiedade; e manutenção da funcionalidade cardíaca.

De volta à sala de aula, o plano de treino é aplicado pela estudante de Mestrado, Gabriéla Monteiro. A ela quem cabe a missão de orientar as participantes e juntas, encontraram neste programa um desafio que as obrigou a ir mais além do que aprendem nas sessões. A ideia é fazer um acompanhamento mais ou menos personalizado  e para isso “há que conhecer as pessoas, perceber o processo que tiveram e, a partir daí, tentar estudar caso a caso para preparar as aulas de acordo com a especificidade e limitações de cada uma”, explica a professora.

Entre a prática de diferentes exercícios físicos os aspetos trabalhados nas aulas visam sobretudo a recuperação e o aumento da mobilidade/flexibilidade e da aptidão física das participantes. Os resultados, esses, vão muito para além disso. “Muitas vezes as pessoas chegam aqui sem vontade, mas no final da sessão agradecem, porque esqueceram a noite mal dormida, ou as dores que têm, até mesmo a falta de vontade de levar os filhos à escola”, diz José Vilaça-Alves.

Para Joana o plano de treinos funciona há já uns meses. Neste programa encontrou a solução para “carregar as energias” que o tratamento a um cancro da mama lhe vai tirando: “hoje em dia tenho uma melhor mobilidade. Desde que estou aqui, de tratamento para tratamento, sinto melhoras físicas”, diz.

A frequentar também as aulas, mas online, está Fátima. Este programa “libertou-me de certas preocupações. Pouco ou nada podia fazer com um braço e hoje já posso fazer quase tudo. E depois há o convívio, o rir, o conversar com as colegas e a professora. Faz-nos bem à mente e ao físico”, confessa.

No final da sessão o cansaço físico contrasta com a leveza da mente. E uma certeza fica bem vincada pelas participantes: “gostávamos que o programa continuasse e, de preferência, que fosse incluído nos tratamentos”.

A ideia agrada a Vilaça que, no balanço de “uma experiência enriquecedora” lamenta apenas “a pouca divulgação e apoio” de um projeto “que tem pernas para andar e que faria todo o sentido existir em ginásios, centros hospitalares ou centros de saúde.”

E seria tão simples dar continuidade a este programa cujos indicadores mostram ser fundamental para esta população: “bastaria um espaço, uns colchonetes, música e um professor…”, remata José Vilaça-Alves.