António José Martins é natural de Ribeira de Pena e há 20 anos que está, como voluntário, nos bombeiros da terra. Começou em 1997 a dar forma ao sonho de criança” apoiado por um professor de Educação Física, comandante dos bombeiros, na altura”. Agora é ele o Senhor Comandante.

| por: Sara Tapa

Sara Tapa: Há quantos anos é bombeiro e como começou esta ligação?

António José Martins: Iniciei a minha atividade no ano de 1997. Tudo começou desde muito novo: não fui exceção ao sonho de muitas crianças de ser bombeiro. Para além disso, na infância, tinha vários vizinhos que eram bombeiros e também fui muitas vezes apoiado pelo meu professor de educação física que era comandante dos bombeiros, na altura. Por isso… cá estou!

No combate aos incêndios florestais, quais as principais dificuldades que encontrou no terreno ao longo destes 20 anos?

Dificuldades encontramos todos os dias. A desertificação da zona norte é uma realidade que não nos podemos esquecer. Temos também, cada vez mais, uma população idosa e isso é notório. E, principalmente, a desorganização que existe no perímetro florestal que carece, urgentemente, de medidas drásticas e rápidas na estruturação e no ordenamento. Não nos podemos esquecer do aquecimento global e que é muito importante.

Como Comandante dos Bombeiros de Ribeira de Pena, sente que a sua responsabilidade é maior, pelo facto de estar num concelho com uma das grandes manchas florestais de pinheiro bravo?

De maneira alguma. Como Comandante, não acho que tenho mais ou menos responsabilidades que os meus colegas comandantes. No entanto, tenho a plena consciência que temos, na nossa área de atuação, riscos acrescidos. Desde a orografia do terreno ao vasto povoamento florestal existente, para além de existirem povoações isoladas junto desses mesmos espaços. Para relembrar: Ribeira de Pena tem cerca de 20 mil hectares de área e 14 mil é povoamento florestal.

No combate aos incêndios, como é que funciona a coordenação com os outros agentes da Proteção Civil?

Nós somos dirigidos por uma diretiva Operacional Nacional. E dentro dessa diretiva, existe o Sistema Integrado de Proteção e Socorro (SIOPS), que define a articulação entre todas as equipas que fazem parte da estrutura da Proteção Civil. Há um comando único: em cada momento só existe um Comandante de Operações de Socorro (COS) a coordenar. Eu nunca achei que houvesse dificuldade no terreno em relação a esse aspeto, sinceramente.

No seu entender, qual é a viabilidade do atual modelo de combate aos incêndios florestais? Acha que os recursos são suficientes?

O dispositivo é avaliado e discutido em cada distrito todos os anos. Parece-me que deve ser avaliado, mediante as condições meteorológicas previstas pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o que muitas vezes não acontece. Nós tínhamos conhecimento das condições meteorológicas, e que este ano iam ser adversas para a fase Bravo, e o que se fez foi um dispositivo igual ao anterior. Foi tipo um “copy paste” do ano anterior. A fase “Charlie” entrou agora no dia 1 de julho que é considerada a “época alta” dos fogos florestais.

A fase Bravo, normalmente, é uma fase mais calma…

Portanto, não ligamos muito áquilo que nos foi dado a conhecer. Isto é, que íamos ter uma fase Bravo com meteorologia agravada. Fizemos um “copy paste” … Fizemos não! Fizeram um “copy paste” do dispositivo do ano anterior.

Em relação ao dispositivo, há vários fatores que nós temos que ter em consideração nessa análise. Temos um sistema nacional de florestas que é constituído por três pilares: a prevenção, que diz respeito ao Instituto de Conservação Nacional da Floresta (ICNF); temos a vigilância e fiscalização que diz respeito à GNR e temos a parte do combate e que cabe à Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC). O que nós vemos constantemente é o terceiro pilar estar no lugar do primeiro. Desta forma, alguma coisa não está a correr bem: alguém dos patamares um e dois não está a fazer o trabalho que deveria ser feito.

Em relação ao dispositivo… quer dizer, nós, na fase Charlie, temos cerca de 10 mil operacionais, temos duas mil viaturas, temos cerca de cinquenta meios aéreos. Tudo isto a nível nacional. Se olharmos para este dispositivo para um ano considerado normal, em que, por dia, tenhamos as 100/150 ocorrências, eu penso que é suficiente. Agora se chegarmos às 400/500 ocorrências por dia, este dispositivo não é suficiente porque, como eu disse, o primeiro e o segundo pilares não funcionam.

Agora, relativamente aos Bombeiros Voluntários… qual é o grau de profissionalismo que se lhes exige?

Eu em relação a essa questão costumo sempre dizer que o nome “Bombeiros Voluntários” faz parte só daquela questão da inscrição nos corpos de bombeiros, porque a partir daí, é todo um sistema e todo um trabalho que é profissional. Nós não podemos estar a fazer um trabalho só porque nos apetece fazer daquela maneira. Nós dirigimo-nos por regras e é assim que trabalhamos. Todo o trabalho que fazemos é profissional. Damos o nosso melhor para que as coisas sempre resultem bem e que não causem danos a terceiros.

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Como é que se mantém os Bombeiros Voluntários motivados?

Olhe, eu estou aqui há 20 anos e nem eu sei responder a essa pergunta. É uma pergunta que deve ser colocada a todos os operacionais. Agora, o sistema de ingresso na carreira de Bombeiros passa por uma inscrição, na qual eles são submetidos a sete ou oito meses de formação. Geralmente começamos com turmas de 10/15 elementos e ficam os que realmente querem ficar. Acabamos muitas vezes com turmas de 4/5 ou 6 elementos. Mas se esses 5/6 elementos ficam é porque há uma grande vontade da parte deles em querer ajudar na missão que é a dos Bombeiros Voluntários.

Acha que os incentivos que existem são correspondentes ao trabalho que lhes é exigido, ou há algo a melhorar?

Eu acho que da parte da tutela não existem esses incentivos. Para além da isenção de taxas moderadoras e do apoio social do bombeiro, pouco mais existe. Agora o que tem existido é pela parte das câmaras municipais. Recentemente a câmara municipal de Ribeira de Pena, fez um regulamento de concessão de regalias sociais aos bombeiros voluntários, onde constam uma série de incentivos, esse regulamento já foi aprovado e já saiu em Diário da República, carece agora dos 30 dias que temos de esperar para o começar a utilizar. Acho que estes incentivos por parte dos municípios se deve louvar, é algo que se deve enaltecer porque tem efetivamente um conjunto de regalias que podem permitir a que o voluntariado se instale nos corpos dos bombeiros.